quarta-feira, 21 de maio de 2008

LAURA, DA PADARIA



- Que é isso?
- Fica quieto. Este revolver não é de brinquedo. Portanto,não tente dar uma de besta. Vamos sair da portaria e subir ao apartamento. Sua mulher está comigo, mas veio de livre e espontânea vontade. Permita que me apresente: sou o irmão da Laura, da padaria.


***
- Queria pedir desculpas pelo que aconteceu aquele dia.
- Que é isso!
- Foi muito chato.
- Se soubesse que seu patrão ouviria, não teria reclamado do sanduíche.
- Ele é muito ignorante. O senhor nem estava brigando.Só dizendo que tinha pedido sanduíche de queijo.
- Eu ia comer o de presunto do mesmo jeito.Também gosto.
- É, mas o português foi logo me mandando ir pra dentro. Fiquei até com vergonha.
- Mas agora está tudo bem, né?
- Está. Agradeço o senhor por ter falado para ele que o caso não tinha importância.
- Tudo bem.
- Meu nome é Laura.
- Prazer.


***
-Você pensou que nunca ia ser descoberto, não é mesmo? Que ia continuar levando sua vidinha sem nenhum problema.Acontece que resolvi levantar tudo. Falei com as meninas da padaria; com o zelador do prédio. Não foi difícil descobrir quem era sua mulher, entrar em contato com ela, contar tudo e trazê-la aqui, para confirmar na sua frente.Aliás, vocês aqui do prédio precisam dar uma dura no zelador.Ele fala demais, principalmente depois de umas duas cervejas. A coisa ficou mais fácil ainda porque sou investigador de polícia e interrogar é comigo mesmo.

***
- Moro em Praia Grande, com meu irmão e minha cunhada. Ele é investigador de polícia e vive dizendo que é perigoso trabalhar aqui em Santos porque chego tarde em casa. Mas foi o único emprego que arranjei e eu já não agüentava mais viver de favor na casa deles.Agora tenho dinheiro para minhas coisas e ainda dou uma ajuda preles dois. Gosto das meninas da padaria, dos padeiros. A única pessoa chata é o português. O senhor acha que estou falando muito? O senhor é meio calado, as meninas dizem que sou a única que consegue conversar com o senhor, mas só eu falo.
- Não é bem assim, eu também falo.
- Mas não diz muita coisa. Chega de manhã, toma café; passa de noite, faz o lanche e vai embora. Não é que nem os outros fregueses, que conversam, dizem piadas pra gente, aparecem com os amigos.
- É o meu jeito
- O senhor é casado?
- Sou.
- Mas nunca vi o senhor com sua esposa.
-Não moro com ela.
-Como assim?
-A gente vive em casas separadas: ela lá na Ponta da Praia e eu aqui, no José Menino.
-Nossa! E isso dá certo?
-Ainda não sei direito.


***
- Sua mulher me disse que vocês fizeram um trato de viverem em casas separadas para salvar o casamento. Só que ela não esperava que você fosse tão sem-vergonha, não é mesmo?Quando se sentiu livre,a primeira coisa que fez foi arranjar um caso.E justamente minha irmã, uma menina ainda. Não tem vergonha, não?Um homem de 50 anos tendo caso com uma menina de 18?Já contei tudo para sua mulher e sugeri que viéssemos até aqui para a confirmação. Como você vê, ela concordou.
- Para que essa violência, este revolver? Adelaide, por que você não fala nada?
- Ela não tem que falar. E, como Laura nunca me disse nada sobre seus namorados, investiguei bem e tenho as evidências. Sei até que você e ela passaram uma noite juntos, neste apartamento. Vamos, confirme tudo.Agora! Na frente de sua mulher.


***
- Tem uma moça aqui embaixo querendo falar com o senhor. A Laura.
- Pode mandar subir.
- Preciso que o senhor me ajude.Meti-me em encrenca. Estou grávida.Tentei conversar com meu namorado sobre o que fazer e ele disse que isso não é problema dele. Meu irmão não pode saber de nada. Do jeito que é, vai me expulsar de casa.Para piorar a situação, discuti hoje com o português e fui demitida. Fiquei a tarde inteira zanzando pela praia, sem coragem de ir para casa de cabeça quente. Procurei a única amiga que tenho aqui em Santos, para ver se eu podia dormir lá, como fiz outras vezes, mas ela tinha ido viajar. Aí me lembrei de vir aqui. O senhor disse que sua mulher quase nunca vem, por isso acho que não vou causar nenhum problema. Posso dormir aqui? Amanhã vou embora bem cedinho.
- Pode. Fico na sala e você no quarto.


***
- Já que você trouxe a Adelaide, por que também não trouxe a Laura para esta conversa? Aí ficava tudo explicado.
- Ela não pôde vir. Nunca mais vai poder ir para lugar nenhum. Ela morreu. Entendeu? Morreu! O médico disse que foi hemorragia , causada por uma tentativa de aborto. Foi então que resolvi descobrir o cara que a engravidou e  acabar com sua raça. Uma bala na cara do safado, pensei. Depois, quando soube que era você , mudei de idéia. Por que estragar minha vida com isso? Descobri que poderia estragar a sua, sem acabar com ela.E é o que estou fazendo agora. Quanto à senhora, é sua vez de se entender com ele.


***
- Já que ele foi embora,Adelaide, posso explicar tudo?
- Não.

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